top of page

     “Todo dia a gente acordava e tinha uma pilha de gibi na cabeceira da cama, era o nosso pai que sempre trazia gibi de todo tipo. Turma da Mônica, Disney, Marvel, DC; tudo ali misturado. Na época era muito barato, e aquilo era basicamente a nossa diversão. Nosso pai também gostava de desenhar com a gente, ele fazia uns desenhos bem toscos e a gente achava aquilo perfeito: ‘Nossa, pai desenha demais! ’. Com o tempo, isso foi crescendo dentro da gente, a vontade de ler e desenhar. Aprendemos a ler com os quadrinhos”. E não apenas ler. O quadrinhista Caio Oliveira, certamente, aprendeu bem mais que isso. Criador de quatro publicações já lançadas no mercado, também disseminou o seu trabalho nos Estados Unidos e, simultaneamente, têm obtido êxito com a sua fanpage no Facebook. 

 

     Através da economia criativa, tanto novos artistas quanto os já conhecidos no cenário autoral piauiense, vêm divulgando e distribuindo a sua produção pelo país. O que há pouco tempo dependia de editoras, distribuidoras e de uma série de outros entraves burocráticos, hoje é feito na sala de casa. A tecnologia viabilizou o acesso a novos leitores por meio das redes sociais e de algumas plataformas de leitura online, de maneira prática e ágil. Entretanto, apesar do aumento significativo do consumo na Internet, a forma mais tradicional de comercialização de HQs no país ainda corresponde ao formato físico.

 

     Caio não está sozinho. Outros autores, como Bernardo Aurélio, por exemplo, também herdaram geneticamente a veia quadrinhística. Irmão mais novo de uma família que possui os quadrinhos no sangue, ele enfatiza que a partir do começo dos anos 2000 as pessoas começaram a ver mais HQs brasileiros nas bancas. Desde então, segundo ele, as editoras começaram a apostar mais nas obras nacionais. Porém, o incentivo e estima, que deveriam ser despontados naturalmente, foram, na verdade, mais instigados pela intimidação impressa juntamente com a qualidade das publicações dos artistas independentes.

 

    Sobre o mercado de quadrinhos no Estado, Bernardo externa o fato de que, em Teresina, não existem editoras, mas sim gráficas. “Tenho uma livraria há cinco anos, então o mercado existe. As pessoas têm comprado HQs e existe um cenário forte de autores produzindo. Economicamente é muito trabalhoso, mas existe o retorno pessoal, que é o reconhecimento, o feedback com o leitor. Por esse motivo abri a Livraria. Porque eu quero viver de quadrinhos, mas sei que não conseguiria apenas como autor. Mercado mesmo, editoras que editem de fato, que invistam, que recebam propostas e criem catálogos, isso é muito difícil de encontrar”, explica.

 

     Mas a independência é posta em prática e não há uma espera pelas ofertas dos grandes grupos editoriais. Seguindo essa linha do “faça você mesmo”, Rogério Narciso e Thiago Ramos produziram duas HQs: “O Escafandro”, um fanzine; e “Rhizoma”, um quadrinho metafísico onde se discute o processo de identidade e construção do ser em meio a um universo pós-apocalíptico recheado de criaturas fantásticas. O Rhizoma foi produzido especialmente para a nona FIQ, em Belo Horizonte.

 

     “No Escafandro a gente xerocou, montou e grampeou tudo em casa, já no Rhizoma imprimimos em uma gráfica rápida e terminamos de montar”, explica Narciso, que desenha desde criança com os irmãos e, de forma mais intensa, pouco antes de entrar na universidade, onde teve maior contato com a produção artística. “O Thiago que faz o roteiro, e eu desenho. A gente meio que constrói as ideias juntos. Ele vem com os argumentos e aí partimos para o layout, onde vamos projetando a história. O quadrinho é muito disso, a visualidade em si. O roteiro tem que ser específico”.

 

     Além de todas as formas autonômicas de se produzir, uma alternativa viável e bastante utilizada atualmente é o Crowdfunding. Trata-se de uma “vaquinha eletrônica”. Nela o leitor contribui antecipadamente com os custos da publicação e, em troca, recebe algumas recompensas que variam do recebimento da própria publicação a, incrivelmente, do ponto de vista da maioria dos fãs, ser incluído na história como um dos personagens.

 

     Caio Oliveira viabilizou três publicações através de um projeto chamado Panza, que é uma continuação direta de Dom Quixote em forma de quadrinhos. A história se inicia nos momentos finais da famosa obra, quando o moribundo Dom Alonso, em seu leito de morte, faz o último pedido ao fiel escudeiro Sancho, lançando-o assim em uma última grande aventura: percorrer o mundo em busca dos livros da sua biblioteca perdida. A vaquinha foi tão bem-sucedida que ultrapassou os 419% da sua meta inicial de quatro mil reais, chegando a arrecadar quase dezessete mil, o que permitiu a publicação de dois outros títulos do autor: “All Hipster Marvel” e “Mago Supremo”.

 

     Indubitavelmente, os responsáveis por tudo isso são Super-Heróis, que se disponibilizam, com grandes esforços, a nos salvar do escuro que é a vida sem a arte. Avante, Quadrinistas!

Independentes, os verdadeiros super-heróis piauienses nos mostram sua força

quadrinhistas piauienses não medem esforços para viabilizar suas publicações

por: Moura Alves

© 2016 Meduna - Loucura Pouca é Bobagem

bottom of page